2013/05/09

hOra abóbora! Um poema para a minha mãe, e para a Alma Mater... Escrito há tempos, mas hoje é o dia certo para o revelar.



hOra abóbora!

«Chiça, que a vida está
de trepar pelas paredes, por cá!» 
«Ora abóbora!», 
queixavam-se as avós 
sem comida na panela.
Apavoradas, diziam:
«Diacho, já nada sobra!»
Só que mesmo sem cheta,
algumas delas viviam,
nem tristes nem coitadinhas,
muito atrevidinhas,
sempre paredes-meias
com as boas ideias.
Fugiram ao queixume da treta,
e aos seus netos confessaram:
«Trepar pelas paredes
─ estas, tão feias, que aqui vedes?! ─
é coisa para abóboras e feijões
e não para nós,
já pouco ágeis avós,
avessas a trambolhões!»,
E de facto,
outra coisa elas fizeram,
numa espécie de pacto:
aos seus netos elas deram
feijões e pevidinhas
que guardavam em caixinhas.
Disse então a avó que era
porventura mais sincera:
«Ora, abóbora,
eu cá não desisto!
Está mais que na hora
de pôr mãos à obra
e um pouco de ordem nisto.»
Nenhuma voz lá fora
soava tão bem, à janela,
nem tão límpida como a dela!
Quem não perde a esperança
não tem medo, nem se cansa:
«Bora lá, que é primavera,
estendam ali uma rede,
para ao longo da parede
treparem abóboras por ela,
engrossando ao sol, para a panela!»
E a tal avó, que não era
nada parva, só sincera,
foi limpando ao seu fogão o pó.
Sentia de si mesma menos dó,
e junto dos seus netos
novamente insistiu:
«Bora lá, dar um salto,
este sim, qualitativo:
erguer abóboras ao alto
em solo coletivo!»
Porque não é só no templo
que se dá o exemplo.
Também ao sol e à lua,
dançando em plena rua.
Nenhum dos netos ligou àquilo
até porque nem entenderam...
Mas em tom mais convincente,
e noutro estilo,
 a avozinha exigiu:
«Não fiquem a aboborar
deitados na cama, apenas!
Para a nossa fome acalmar
é tão fixe quanto urgente
plantar muitas, muitas cenas,
grandes, médias e pequenas!»
Assim dito, os seus netos perceberam.

Texto de:
Adelaide Chichorro Ferreira, núcleo de Coimbra da Quercus, Professora na FLUC e membro do CIEG (começado a escrever em Coimbra a 3.4.2013, depois revisto e publicado neste blogue a 9 de Maio de 2013). António Oliveira redigiu um guião com base neste texto.

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